Saúde

Do bem-estar ao adoecimento: quando a vida fitness passa do limite

Quando a busca por saúde e boa forma ultrapassa o equilíbrio, surgem comportamentos como o MODE e a ortorexia, marcados por rigidez alimentar e obsessão estética.

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Foto: Reprodução/ Lance!
Foto: Reprodução/ Lance!

A busca por saúde e boa forma nunca esteve tão em alta. No entanto, quando disciplina e cuidado com a alimentação ultrapassam a linha do equilíbrio, surgem comportamentos pouco discutidos. Entre eles estão o MODE (Muscularity-Oriented Disordered Eating, em português: Transtorno Alimentar Orientado à Muscularidade) e a ortorexia, ambos marcados por padrões rígidos e pouco realistas.

MODE: a obsessão pela muscularidade

O MODE caracteriza-se por comportamentos voltados ao ganho de massa muscular e redução extrema de gordura corporal. Entre eles:

  • Contagem compulsiva de proteínas e calorias;
  • Uso excessivo de suplementos;
  • Treinos compensatórios após deslizes na dieta;
  • Checagem corporal frequente e comparação com outros;
  • Uso de ergogênicos como anabolizantes, associado ao risco de efeitos colaterais sérios.

Mais comum em jovens do sexo masculino, a consequência vai além do físico: ansiedade, isolamento social, alterações metabólicas e até danos à saúde mental e hormonal.

Outro ponto importante é a hiperexposição à proteína. Não apenas atletas, mas também o consumidor comum recebem diariamente uma enxurrada de opções proteicas. A Starbucks, por exemplo, lançou recentemente bebidas com até 36 g de proteína por copo e transformou a proteína em símbolo de status ‘fitness’. Essa tendência mostra como a sociedade passou a exigir que cada refeição seja maximizada, mesmo sem necessidade clínica real.

Ortorexia: o mito da pureza alimentar

Já a ortorexia se manifesta como obsessão por comer apenas “limpo” ou “puro”. A pessoa restringe grupos alimentares, passa horas planejando refeições e evita situações sociais com medo de “errar”. Embora a intenção inicial seja “viver saudável”, o efeito é justamente o contrário: isolamento, culpa e carência de nutrientes. Diferente do MODE, o foco não está na hipertrofia, mas na perfeição da dieta.

Vale lembrar: a ortorexia não possui critérios diagnósticos oficiais, mas já preocupa profissionais de saúde. O mesmo acontece com o MODE: os manuais diagnósticos, como o DSM-5 e o CID-11, ainda não o classificam formalmente como transtorno alimentar. Mesmo assim, a literatura científica já o reconhece como um padrão patológico de comportamento alimentar que exige atenção clínica.

A influência das redes sociais

As redes sociais exercem um papel significativo e multifacetado no MODE. De um lado, podem oferecer acesso rápido a informações sobre saúde e treino. Por outro, os algoritmos tendem a amplificar conteúdos extremos e corpos visualmente impactantes, justamente porque chamam atenção e geram engajamento. Essa lógica faz com que imagens de resultados radicais sejam mais vistas, o que reforça comparações e pressões sociais, especialmente entre os mais jovens e perfeccionistas.

Onde termina o saudável e começa o risco

Sinais de alerta incluem:

  • Plano alimentar rígido e sem margem para flexibilidade;
  • Culpa ou punição após refeições fora da rotina;
  • Uso excessivo de suplementos e interesse em ergogênicos;
  • Medo intenso de determinados alimentos;
  • Isolamento social por conta da dieta;
  • Excesso de foco na quantidade de proteína em absolutamente tudo.

O papel do nutricionista

O nutricionista precisa ir além da contagem de macros:

  • Investigar rigidez, uso de suplementos, ergogênicos e culpa associada à comida;
  • Evitar reforçar o transtorno com protocolos extremos de proteína ou estética;
  • Resgatar a flexibilidade alimentar e o prazer em comer;
  • Orientar o consumo crítico de redes sociais, incentivando fontes confiáveis;
  • Trabalhar em equipe com psicólogos e médicos, quando necessário.

Mais do que prescrever, cabe ao profissional acolher, educar e orientar. Afinal, saúde não é só corpo definido ou dieta perfeita, é energia, equilíbrio e qualidade de vida.

O desafio da época é reconhecer quando o “estilo de vida saudável” virou prisão. Entre disciplina e obsessão, há uma linha tênue. Nada ao extremo é saudável. Você pode e deve seguir uma dieta para alcançar seus objetivos, mas ela precisa se adaptar à sua vida, e não o contrário.

Bruna Tommasi

Colunista

Nutricionista graduada pela Universidade Vila Velha e pós-graduanda em Nutrição Esportiva e Estética. É apaixonada por promover saúde de forma prática, combinando ciência e estilo de vida para ajudar as pessoas a alcançarem seus objetivos com equilíbrio

Nutricionista graduada pela Universidade Vila Velha e pós-graduanda em Nutrição Esportiva e Estética. É apaixonada por promover saúde de forma prática, combinando ciência e estilo de vida para ajudar as pessoas a alcançarem seus objetivos com equilíbrio