Senado argentino decide sobre aborto até 3,5 meses; tendência é de rejeição
O Senado argentino decide nesta quarta-feira, 8, se aprova ou não o projeto que permite a interrupção voluntária da gravidez até a 14ª semana de gestação. É a primeira vez que a discussão chega a essa instância na Argentina. As últimas sondagens mostravam a vantagem do "não", com 37 dos 72 senadores afirmando que votariam contra o projeto de lei, segundo levantamento do jornal La Nación.
As pesquisas sobre a votação na Câmara indicavam a mesma tendência e o projeto foi aprovado em junho por 129 votos a favor, 125 contra e 1 abstenção.
A lei argentina prevê penas de 1 a 4 anos de prisão para a mulher que decide interromper a gravidez - exceto em casos de estupro e risco de morte da mãe. Segundo a última pesquisa Ipsos, 49% dos entrevistados eram contrários à legalização do aborto, enquanto 40% eram favoráveis e 11% não opinaram.
No primeiro grupo, está Marcelo Rossi, de 35 anos, voluntário da Fundação Elegí Sonreír (Prefira Sorrir). Ele integra a campanha contrária à descriminalização do aborto. "Somos contrários à prática, independentemente da questão econômica ou de classe social. Não se trata do direito a abortar ou não, se trata do direito da mulher, mas também de quem está por nascer", argumenta. "Há vida desde o momento da concepção, então há uma parte que fica esquecida nesse projeto de lei", argumenta.
Para ele, o projeto não coloca como prioridade a saúde da mulher. "Em 2016, último com cifras oficiais, morreram 525 mulheres por problemas nutricionais, milhares por doenças cardíacas e mais um monte por doenças que podem ser prevenidas. No entanto, por abortos clandestinos, as mortes foram 31, oficialmente. Cada morte é importante, cada pessoa é importante, mas essa lei não mostra a prioridade de milhares de mulheres que passam por alguma situação vulnerável. Se queremos ajudar as mulheres, comecemos por causas em que estão milhares delas."
No grupo dos defensores da legalização está Elsa Schvarpzman, de 67 anos, socióloga e pesquisadora na Universidade de Buenos Aires. Ela trabalha na campanha em favor da legalização. "Direito ao aborto é uma questão de justiça social, sabendo que neste momento quem decide pelo aborto e tem condições de pagar não sofre nenhum tipo de consequência física, como as pessoas mais pobres que recorrem a práticas precárias", argumenta.
Ao jornal O Estado de S. Paulo, ela disse que dados que apontam a viabilidade da legalização foram passados a assessores dos senadores, mas admite que a aprovação será difícil. "A situação é muito complexa. É uma Casa mais difícil do que a Câmara dos Deputados, eles (senadores) têm muitos compromissos com os poderes eclesiásticos, econômicos e políticos."
Custo
No fim de semana, a mudança de voto da senadora opositora Silvina García Larraburu pendeu a balança ainda mais para o lado do "não". Um dos argumentos levantados por senadores indecisos é o peso econômico que a aprovação teria não apenas para o governo federal, mas para as províncias. O analista político argentino Ricardo Rouvier acrescenta que está em jogo o capital político dos senadores. "Eles sofrem a pressão do setor religioso. No interior da Argentina, o peso dos bispos e da Igreja continua muito importante."
O ministro da Saúde, Adolfo Rubinstein, defende o projeto. Em apresentação ao Senado, ele mostrou estatísticas da redução do número de abortos em países onde a prática é legal. Há na Argentina, segundo ele, 50 mil internações anuais consequentes de abortos clandestinos.
Mesmo se rejeitado, o projeto pode voltar a ser apresentado no ano que vem. Uma peculiaridade do tema é ter colocado no mesmo grupo inimigos históricos no Parlamento. "A discussão causa divisões dentro dos partidos políticos, tanto do governista quanto o da oposição", explica Rouvier.
Ele acredita que uma aprovação do aborto não ampliaria a base eleitoral do presidente Mauricio Macri. Pelo contrário, poderia prejudicá-lo com parte dos atuais partidários. "Os grupos que impulsionam o projeto de legalização do aborto não são, em sua maioria, eleitores de Macri", explica. Na última semana de julho, uma das hashtags mais usadas na Argentina era #MacriConAbortoNoTeVoto, referindo-se a eleitores do presidente que deixariam de apoiá-lo. "Ninguém pode acusar o presidente de ter ignorado o tema, ao contrário, ele tomou a iniciativa (de levar o projeto ao Congresso)." A ex-presidente Cristina Kirchner, que nunca levou a questão a votação e era contrária à legalização, mudou de posição.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.