Por que o crescimento econômico é ainda importante?

Mais uma vez o debate se o crescimento da economia de fato importa retornou. Não deveria haver mais dúvidas de que ele efetivamente é relevante porque nos últimos anos o boom dos preços favoráveis das commodities que exportamos possibilitou a emergência de uma nova classe de renda no Brasil. Uma estagnação mundial não poderia ter possibilitado tal feito, independente da vontade política e das virtudes do governo.

O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), que mede o avanço na produção de bens e serviços em uma economia, é muito importante por diversos motivos. Vejamos o lado da oferta (demanda de investimento). Qual empresário razoavelmente racional investirá e inovará em uma economia semi-estagnada? O mais natural é que ele busque adiar investimentos, o que impactaria logo adiante nos níveis de atividade econômica (PIB) e emprego.

Nesse contexto, as receitas tributárias dos três níveis de governo sentiriam o impacto da redução da atividade econômica e a pressão na fila de desempregados da seguridade social. Admitindo-se que uma resposta governamental que buscasse elevar tributos acabaria elevando a informalidade nas relações de mercado e a sonegação fiscal, os governos seriam então pressionados a gerar déficits fiscais por um tempo que dificilmente se poderia especificar de antemão (ex ante). O que poderia acontecer a mais nesse cenário contracionista?

Com menos recursos financeiros disponíveis em caixa, os governos muito provavelmente cortariam gastos necessários que garantiriam o acesso equitativo a uma educação pública universal e de qualidade. Insatisfações sociais, desarmonia, conflitos distributivos (mercado) e redistributivos (Estado) eclodiriam. Greves de servidores públicos estão pipocando no Brasil e muitos empresários, por sua vez, reclamam recorrentemente da baixa qualificação dos trabalhadores e de como os ganhos salariais têm ocorrido nos últimos anos acima dos avanços médios de produtividade da economia.

Essas observações não soam estranhas aos conhecedores da teoria do desenvolvimento econômico. Arthur Lewis, em 1954, publicou um trabalho que ainda merece atenção.  Para um contexto de oferta ilimitada de mão de obra, “a formação de capital e o progresso técnico não resultam em salários crescentes, mas na elevação da participação dos lucros na renda nacional”. Tal fato não implicaria automaticamente na elevação expressiva da taxa de investimento produtivo, FBCF.

Ondas de fusões e aquisições estão ocorrendo, mais uma vez, para buscar regular a concorrência, as quantidades ofertadas e os preços nos mercados. Trata-se de algo que tenderá a aumentar o poder de barganha do capital em relação ao fator trabalho e que não necessariamente contribuirá de forma significativa para elevações dos investimentos produtivos e do ritmo de crescimento sustentado da economia. Este seria mais um ajuste cíclico defensivo de posições pelo lado da oferta.

Não se percebe grande vontade de se investir empresarialmente em pesquisa e desenvolvimento no Brasil, apesar do discurso da inovação ter se tornado senso comum. Segundo Lewis, “nas economias atrasadas o conhecimento é um dos bens mais escassos”. A histórica concentração de renda poderia ser interpretada então como uma faceta do baixo poder de barganha de expressiva parcela da classe trabalhadora mal-qualificada e com acesso a serviços de educação pública de qualidade ruim. Não se poderia esperar crescimento significativo e voluntário da poupança doméstica nesse ambiente. Há ainda quem acredite em truques e adiamentos eternos de reformas institucionais progressistas.

Uma política keynesiana bastarda, algo que funcione sem controles transparentes de capitais e que privilegie persistentemente a demanda de consumo, muito provavelmente causaria déficits crescentes e insustentáveis na conta corrente do balanço de pagamentos. Dificilmente tal política econômica se sustentaria por muito tempo.

Um contexto de semi-estagnação econômica, portanto, não ajudaria a melhorar a situação da classe trabalhadora brasileira. Tampouco seria uma surpresa se a recente e tão comemorada redução das desigualdades sociais fosse revertida. Espero que esse quadro negativo não se manifeste entre nós, porém todo cuidado se faz necessário nesse momento. Creio ser necessária uma maior discussão quanto aos aspectos quantitativos e qualitativos do crescimento econômico brasileiro. Afinal, qual é a agenda brasileira de desenvolvimento?

Rodrigo L. Medeiros (D.Sc.) é membro da World Economics Association (WEA)
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W. Arthur Lewis, O desenvolvimento econômico com oferta ilimitada de mão de obra. 1954.

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