Deputados querem incluir Aracruz e Santa Leopoldina na Grande Vitória. Mas, pode?

Barra do Sahy, em Aracruz, e vista panorâmica de Santa Leopoldina / crédito: portais das prefeituras

Dois projetos de leis complementares com o objetivo de aumentar o tamanho da região metropolitana do Estado tramitam na Assembleia: um é o 40/2023, do deputado Vandinho Leite (PSDB), que quer incluir Santa Leopoldina na Grande Vitória. O outro, 48/2023, é da deputada Iriny Lopes (PT), e pretende acrescentar Aracruz entre as metrópoles.

Hoje, a Região Metropolitana da Grande Vitória é composta por sete municípios: Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica, Viana, Guarapari e Fundão – sendo que os dois últimos foram incluídos à região em 1999 e em 2001, respectivamente.

As matérias são polêmicas e têm dividido a população local às vésperas de um ano eleitoral. Por um lado, os deputados defendem que a entrada das duas cidades na região metropolitana pode ser benéfica por conta das políticas públicas que já são aplicadas na região e que seriam estendidas aos novos integrantes.

Porém, há uma parcela da população que é contrária, tem medo de que haja aumento da criminalidade, enfraquecimento da economia local, do turismo e até que o município perca sua identidade.

Os prós – Sistema Transcol

O PLC de Vandinho sobre Santa Leopoldina é mais antigo, foi protocolado no dia de 1º de agosto e ainda não passou por votação nas comissões temáticas e nem no plenário. Ao fundamentar o projeto, Vandinho citou as vantagens de se pertencer à Região Metropolitana:

Vandinho Leite / crédito: Lucas S. Costa/Ales

“As vantagens oriundas do reconhecimento de uma região metropolitana são diversas, destacando-se como a principal o fator condicionante do diálogo entre os municípios que compõem a área ou microrregião em vários aspectos do poder local, sejam eles econômicos, sociais, culturais etc, na busca de soluções comuns, na busca de melhorias, avanços e construção conjunta de um planejamento regional”, disse ele na justificativa.

Já o projeto de Iriny, que foi protocolado no último dia 15, defende a competência do Estado e dos legisladores estaduais para tratarem do assunto, citando leis estaduais e federais que garantem a legalidade do processo. Santa Leopoldina hoje faz parte da microrregião Central Serrana e Aracruz integra a microrregião do Rio Doce.

Embora não tenha sido especificado nos dois projetos, em conversas com a coluna, os dois deputados disseram que o maior benefício da entrada dos dois municípios na Região Metropolitana seria a questão do transporte público.

Pertencendo à Grande Vitória, Santa Leopoldina e Aracruz seriam atendidos pelo Sistema Transcol, que é o sistema de transporte público que circula na região metropolitana – atende melhor os municípios de Vitória, Serra, Vila Velha, Cariacica e Viana, mas também chega a Guarapari e Fundão. Essa seria a principal demanda dos que defendem a mudança de região dos dois municípios, já que hoje, moradores dessas localidades, para se locomoverem, fazem uso de ônibus de viagem.

Mas não é só a questão do transporte. A Região Metropolitana conta com políticas públicas integradas, debatidas no Comdevit (Conselho Metropolitano de Desenvolvimento da Grande Vitória) e aplicadas nos municípios que integram a Grande Vitória.

Além do Transcol, são obras de mobilidade urbana e de saneamento básico, entre outras, que acabam contemplando toda a região. Fora a equiparação salarial entre municípios que pertençam à mesma região, garantida por decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Iriny Lopes / crédito: Lucas S. Costa

Projetos como o aquaviário e o viaduto de Carapina, por exemplo, são pensados para melhorar a mobilidade de toda a região e não somente de um município – o aquaviário envolve diretamente três: Vitória, Vila Velha e Cariacica – e é desse tipo de investimento qus os municípios do interior estariam atrás.

“O transporte coletivo é muito importante, mas não somente. A integração de políticas públicas e o incentivo da iniciativa privada, que acolheu muito bem a proposta, fomenta o desenvolvimento do município”, disse Vandinho à coluna, ao defender seu projeto.

Os contras – Identidade e turismo

O mesmo deputado, porém, disse que tem encontrado resistência por parte da população local. “Os comerciantes que têm se posicionado contra, com medo de perderem clientes, acredito ser um erro e vamos convencê-los do contrário. O comércio de Fundão, por exemplo, se fortaleceu com a inclusão da cidade na Grande Vitória, pois as novas oportunidades geraram renda para a população que gastou mais no município”, disse Vandinho.

Mas há também quem teme um aumento da criminalidade – a níveis da Grande Vitória, o que pode fazer Santa Leopoldina perder o status de cidade pacata do interior – e também um impacto negativo no turismo.

Hoje, há uma rota turística chamada “Rota das Três Santas”, formada por Santa Leopoldina, Santa Teresa e Santa Maria de Jetibá. Uma mudança de região poderia impactar negativamente o turismo, fazendo com que o município perca sua identidade, segundo algumas lideranças da cidade ouvidas pela coluna.

Audiência pública e estudos técnicos

O projeto de Vandinho recebeu um parecer jurídico da Procuradoria da Ales, que citou as exigências para a inclusão de municípios em regiões metropolitanas.

O tema está regulado pela Lei nº 13.089, de 12 de janeiro de 2015, também conhecida como Estatuto da Metrópole, que diz no artigo 3º que: “Os estados, mediante lei complementar, poderão instituir regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, constituídas por agrupamento de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum”.

E o parecer da Procuradoria chama a atenção para o 2º parágrafo do artigo, que diz: “A criação de uma região metropolitana, de aglomeração urbana ou de microrregião deve ser precedida de estudos técnicos e audiências públicas que envolvam todos os municípios pertencentes à unidade territorial”.

Os estudos técnicos são necessários para aferir se realmente aquele município tem afinidade com a região, ou seja, se apresenta as mesmas características para fazer parte. E a audiência pública soma no sentido de ouvir não somente a população do município que se pretende incluir, quanto dos outros que irão receber.

Acontece que nem o projeto de Vandinho e nem o de Iriny contam com os estudos técnicos. Também não foram realizadas audiências públicas sobre o tema.

“O fenômeno da metropolização é tecnicamente demonstrável e aferível. E o sentido da norma é o de evitar o surgimento de novos membros e regiões aleatoriamente, e sem uniformidade com a própria região. Ocorre que a presente proposição em que pese o relatado na sua justificativa, não apresenta dados técnicos que possam subsidiar decisão fundamenta do poder legislativo estadual quanto à expansão das fronteiras da região metropolitana da Grande Vitória”, diz o parecer da Procuradoria, que conclui sugerindo que Vandinho atenda às exigências técnicas.

Qual o critério para entrar na Região Metropolitana?

Embora seja permitido, legalmente, a um deputado, apresentar um projeto para expandir a Região Metropolitana, há alguns critérios que precisam ser atendidos e contidos nos estudos técnicos.

O Estatuto da Metrópole estabelece que a Região Metropolitana é uma “unidade regional instituída pelos estados, mediante lei complementar, constituída por agrupamento de municípios limítrofes para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum”.

Já a área metropolitana é a “representação da expansão contínua da malha urbana da metrópole, conurbada pela integração dos sistemas viários, abrangendo, especialmente, áreas habitacionais, de serviços e industriais com a presença de deslocamentos pendulares no território”.

Segundo o pesquisador e diretor-presidente do Instituto Jones Santos Neves (IJSN), Pablo Lira, o município precisa ser mais urbano do que rural, ter essa movimentação de moradores que vão para o município vizinho para estudar ou trabalhar e precisa contar com um entrelaçamento da malha urbana, também chamada de “mancha urbana”, para que seja considerado da região metropolitana.

Pablo Lira / crédito: arquivo pessoal/Facebook

“No Estado, onde tem essa conurbação, que é o entrelaçamento da malha urbana, é de fato nos municípios de Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica e Viana. A inclusão de Guarapari, em 1999, e de Fundão, em 2001, já não respeitou o critério da contiguidade da malha urbana. A mancha urbana de Vila Velha com Guarapari é muito pequena, assim como também é pequena a de Serra com Fundão. Ao pensar em incluir mais municípios é importante refletir sobre as características regionais”, disse Pablo.

Ele afirmou que o instituto ainda aguarda dados do Censo/2022, feito pelo IBGE, que trará mais detalhes sobre a população capixaba, mas também ressaltou ser de extrema importância ouvir os moradores:

“Primeiro, é muito importante saber se a população tem interesse nessa mudança. Santa Leopoldina tem uma identidade com a microrregião Central Serrana. Aracruz é município considerado como vetor, que polariza os que estão ao redor como Fundão e João Neiva. Na microrregião do Rio Doce ele tem destaque, mas na Grande Vitória vai disputar o protagonismo com Serra, por exemplo”.

Lira lembrou que também não é automático o município entrar na Região Metropolitana e ser contemplado com uma linha do Transcol. “Em Guarapari levou mais de 10 anos para o Transcol chegar ao município e, mesmo assim, só até Setiba”.

Isso porque aumentar as linhas de Transcol representa também aumentar o investimento público no setor, já que o transporte é subsidiado, em parte, pelo governo do Estado.

política também influencia

A secretária de Governo, Emanuela Pedroso, que preside o Comdevit, também viu com cautela a possível mudança e disse ser necessário analisar, primeiro, as características e potenciais dos dois municípios.

“Os municípios que são alvo das propostas de inclusão na nossa Região Metropolitana possuem características bem específicas. Santa Leopoldina é um município com maior extensão rural e agrícola, inserido também no roteiro turístico da região das Três Santas, juntamente com Santa Teresa e Santa Maria de Jetibá. Já Aracruz, está inserido na área da Sudene, com atividades industrial e logística de significativa expressão. Há, portanto, que se analisar os referidos pleitos com base em critérios técnicos e políticos”, avaliou.

O prefeito de Aracruz, Dr. Coutinho, e o de Santa Leopoldina, Romero Endringer, foram procurados eu seus números particulares e por meio da assessoria para se posicionarem a respeito das possíveis mudanças, mas não retornaram aos contatos feitos pela coluna.

Na Ales, além dos dois projetos, também conta um pedido de informação, do deputado João Coser (PT), questionando o governo sobre estudos técnicos para incluir Aracruz na Região Metropolitana. Ele alega que há um abaixo-assinado de moradores nesse sentido.

Ano que vem é ano de eleição municipal, o que significa que pleitos dessa natureza de parcelas da população devem ganhar peso, principalmente, por parte dos futuros candidatos.

 

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