Os 7 pontos que levaram Manato à derrota

Repetindo o que ocorreu no primeiro turno, o capixaba deu vitória nas urnas para o presidente Bolsonaro com uma votação expressiva de 58,04% dos votos válidos. Em números absolutos, ele teve 1.282.145 votos, 355.378 a mais que o ex-presidente e agora presidente eleito Lula, que somou 926.767 votos. No primeiro turno, Bolsonaro pontuou 52% contra 40% de Lula.

Mas, pela segunda vez consecutiva, a maioria dos capixabas preferiu não nacionalizar a eleição estadual e deu ao governador Renato Casagrande (PSB) mais um mandato, derrotando o candidato de Bolsonaro no pleito, o ex-deputado Carlos Manato (PL), que vinha numa linha crescente, conforme mostraram as pesquisas Real Time Big Data – aliás, a última pesquisa acertou o resultado, dentro da margem de erro.

Casagrande teve 1.171.288 votos (53,8%) contra 1.006.021 (46,2%) de Manato, uma diferença de 165.267, ou 7 pontos percentuais, que poderia ter sido superada se todos os eleitores de Bolsonaro votassem em Manato. Porém, 276.124, dos que votaram em Bolsonaro, não votaram em Manato. Por quê?

A coluna De Olho no Poder ouviu algumas lideranças de movimentos conservadores e de direita, além de simpatizantes que não necessariamente fazem parte de grupos organizados, mas que votaram em Bolsonaro e não votaram em Manato. Além de ouvir, também, seu ex-marqueteiro, o jornalista Fernando Carreiro.

Eles apontaram alguns erros da campanha e do próprio Manato que teriam feito com que eleitores mudassem o voto na reta final ou simplesmente não votassem nele. Alguns preferiram falar sob reserva. Assim como os 7 pontos percentuais que separaram Casagrande de Manato na votação, a coluna cita sete pontos citados como falhas na campanha do candidato.

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1 – Falta de um projeto “arrebatador”

Na opinião do ex-marqueteiro, o eleitor conservador na economia queria “algo mais”. “Uma novidade, uma cantiga que pudesse fazer frente ao samba, às vezes fora de tom, da atual gestão. Essa ‘novidade’ também era a aspiração dos mais céticos, que se abstiveram ou votaram branco e nulo no primeiro turno”, disse Carreiro.

“Eles esperavam um novo projeto de Estado, algo que arrebatasse o coração deles. Não encontraram. O segredo da virada, na minha opinião, estava evidente nesses pontos muito importantes. É triste que a campanha, no segundo turno, não tenha conseguido enxergar esses movimentos”, avaliou Carreiro, enfatizando o número de eleitores que não escolheu nem um dos dois projetos.

 

2 – Falta de identidade e de trajetória com a direita

Embora Manato tenha feito de tudo para associar sua imagem a do presidente Bolsonaro – com declarações de apoio dele e dos filhos, além do apoio da primeira-dama do país, Michelle – o candidato era lembrado, a todo tempo, que fez sua carreira política em partidos de esquerda.

Manato é bolsonarista de carteirinha e isso ninguém pode negar. Mas o movimento de direita no Estado não se resume ao bolsonarismo e nem todos abraçaram Manato como o “candidato ideal”. Alguns decidiram por uma postura “conservadora” diante de uma mudança no governo do Estado.

3 – Falta de recursos

A falta de recursos suficientes para bancar uma campanha ao governo do Estado afetou Manato, que recebeu no primeiro turno apenas R$ 100 mil do seu partido, enquanto outros candidatos ao governo de outros estados receberam muito mais. Só a título de comparação, o candidato do PL ao governo de Pernambuco, que nem chegou ao segundo turno, recebeu R$ 11 milhões da legenda.

No segundo turno, Manato conseguiu a promessa de que o PL bancaria até R$ 1,5 milhão dos gastos de sua campanha, mas que quitaria somente no ano que vem, ou seja, Manato teria que negociar com fornecedores para receberem após a eleição, e muitos não aceitaram.

Manato, então, teve de enfiar a mão no bolso e injetar R$ 310 mil na campanha. Ele também recebeu doações de pessoas físicas, entre elas a do presidente do CRM-ES, Fabrício Gaburro, que doou R$ 25 mil. Ao todo, ele conseguiu arrecadar R$ 861 mil frente aos R$ 5 milhões arrecadados por Casagrande, segundo dados disponíveis no TSE. E dinheiro faz falta numa campanha majoritária.

 

4 – Ausência de Magno Malta

Alguns aliados pontuaram que faltou uma presença mais consistente do senador eleito Magno Malta (PL) na campanha de Manato. Isso já não tinha acontecido no primeiro turno e no segundo – quando Magno começou a viajar pelo país, principalmente pelo Nordeste, em caravana, para tentar romper a resistência a Bolsonaro na região – isso ficou mais evidente.

Magno, que também é presidente do PL estadual, chegou a ser questionado pela coluna sobre a falta de apoio do partido, com recursos e estrutura, para Manato. A coluna chegou a questionar se ele não dividiria um pouco do recurso que tinha recebido com o candidato ao governo. A resposta foi negativa. “Manato é rico”, disse Magno à época. Ele também falou que foi combinado, na filiação de Manato, que ele não teria recursos do partido. O que Manato confirmou.

Magno é considerado um bom transferidor de votos, mas aliados mais chegados de Manato dizem que se sentiram “abandonados” pelo senador eleito.

 

5 – Falha na comunicação das propostas

Outro ponto citado foi a falta de clareza e uma dificuldade em detalhar seu plano de governo, muito em cima de promessas e do “vamos fazer”, mas sem explicar “como”. Embora muito questionado, Manato nunca apresentou o impacto financeiro de suas propostas (como criar uma Polícia Rural e Polícia de Fronteira) e nem de onde retiraria o recurso.

Ao deixar lacunas em suas propostas, criou insegurança num eleitorado que majoritariamente já aprova a gestão do governador Renato Casagrande, ainda que com críticas ou divergências. A falta também de um projeto ou de uma “marca” a apresentar para o capixaba, com relação à sua atuação no Congresso, também reforçou no imaginário do eleitorado o ditado de que não se troca o certo pelo duvidoso.

6 – Postura nos embates

Embora a campanha eleitoral tenha sido acirrada, com troca de acusações entre os dois lados, o eleitor capixaba preza pelo respeito e educação, principalmente no debate de ideias. Dificilmente, nas eleições majoritárias, o capixaba elege a “baixaria”. A tendência é que o candidato que se apresente mais equilibrado e moderado emocionalmente, conquiste mais votos.

Para alguns aliados, Manato perdeu o tom em alguns debates abusando do deboche, da ironia e do desrespeito contra Casagrande, o que teria gerado uma insatisfação no eleitorado. O último debate, a três dias da eleição, teria tido um peso fundamental nessa avaliação.

7 – Apelo ao extremismo

Embora não admita, o último debate, ocorrido na TV Gazeta, repercutiu muito mal para Manato. Não se sabe ainda se foi estratégia da campanha ou uma decisão individual do candidato, mas ele ter citado que a pandemia foi uma farsa e acusado, de forma generalizada, médicos de forjarem atestados de óbitos para “inflar” o número de casos de Covid, pegou muito mal. Inclusive nacionalmente.

Outra fala polêmica foi ter acusado o governador de “abortista” por ele ter cumprido uma decisão judicial de aborto legal numa menina de 10 anos, engravidada após ser vítima de estupro e pedofilia.

A legislação sobre o aborto no Brasil permite que a interrupção da gravidez seja feita em três circunstâncias: risco de vida para a mãe, estupro e anencefalia do feto. A menina reunia duas dessas condições. E para que o aborto seja realizado não é necessário decisão judicial. O Estado é obrigado a cumprir a lei. Na ocasião, aliados da então ministra Damares, do mesmo grupo político de Manato, vazaram dados sigilosos, expondo a criança. Até o momento, ninguém foi punido.

O posicionamento de Manato foi visto com preocupação, até por parte de seus colegas de profissão. Muitos médicos assinaram uma carta aberta de repúdio às falas do candidato e teve quem mudasse de voto.

Mesmo derrotado, sai fortalecido

Embora tenha sido derrotado na eleição, Manato deixa a disputa ostentando 1.006.021 votos ou a confiança de 46,2% do eleitorado capixaba. O que é um capital político relevante e precisa ser considerado. Além disso, Manato conseguiu levar a disputa para o segundo turno, algo que não se via acontecer no Estado há 28 anos.

Não se sabe ainda se Manato vai para as trincheiras da oposição, mas seus aliados avaliam que ele sai fortalecido da eleição, mesmo com o resultado negativo, e pode dar trabalho a Casagrande a partir do ano que vem, quando a nova Assembleia Legislativa assume. O PL, partido de Manato, elegeu a maior bancada no Legislativo – cinco cadeiras –, o que vai demandar do governador um esforço maior na articulação política.

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