Dos Anjos x Família Max: a rixa política que atravessa gerações

Enivaldo e Mazinho dos Anjos x Max Filho e Max Mauro: divergências políticas que já duram quatro décadas

Na sessão da Assembleia de terça-feira (14), o deputado Mazinho dos Anjos (PSDB) subiu o tom, como nunca tinha feito desde que tomou posse no parlamento, contra o ex-prefeito e ex-deputado Max Filho, seu correligionário no ninho tucano.

Mazinho saiu em defesa do partido e de suas lideranças e rebateu o ex-prefeito que, numa entrevista exclusiva à coluna De Olho no Poder na última segunda-feira (13), admitiu que pode disputar a Prefeitura de Vila Velha no ano que vem e ainda deixar o ninho tucano: “Acho que já deu”, disse Max, na entrevista.

“Se precisar de um empurrão, eu dou. Vá com Deus, Max Filho”, rebateu Mazinho em seu discurso na Ales, anunciando ainda apoio à reeleição do prefeito de Vila Velha, Arnaldinho Borgo (Podemos), adversário político de Max Filho.

Mazinho ainda falou mais: “O partido está muito bem organizado, bem administrado pelo deputado Vandinho Leite, com a liderança também do nosso vice-governador Ricardo Ferraço. Se você quer colocar a culpa da derrota nas urnas no partido, Max, você está muito enganado. Porque a derrota na urna foi porque a população de Vila Velha cansou. Não quis mais votar no senhor”, despejou Mazinho, como quem joga álcool numa ferida ainda aberta.

Max Filho tentou se reeleger prefeito em 2020. Mas, foi derrotado no segundo turno por Arnaldinho Borgo (Podemos). No ano passado, ele tentou vaga de deputado federal. Porém, teve apenas 16.822 votos e nem ele e nem o partido conseguiram uma cadeira na bancada federal capixaba.

“As urnas deram o recado, então, não adianta botar a culpa no partido. O partido deu a legenda para disputar a eleição, se foi mal votado é porque a população cansou de votar nele. (…) Quem não está satisfeito, não precisa continuar no partido. Não vamos ficar segurando ninguém na marra. Então, ex-prefeito e ex-deputado Max Filho, vá com Deus”, falou Mazinho da tribuna da Ales.

Veja o discurso completo aqui:

O discurso bélico chamou a atenção, principalmente por se tratar de correligionários. Mas como nada na política brota do dia para a noite, a cena vista ontem na Assembleia remonta a um passado não muito distante e joga luz a uma rixa antiga entre duas forças políticas das mesmas famílias.

Um olho no passado

Quando Max Mauro (pai de Max Filho) foi eleito governador do Estado e Enivaldo dos Anjos (tio de Mazinho) foi eleito deputado estadual, em 1986, os dois já eram adversários políticos.

Na época, os partidos PMDB e o PFL foram os grandes protagonistas da eleição. Max foi eleito pelo PMDB, partido que conquistou 16 das 30 cadeiras da Ales. Max venceu a eleição contra Elcio Alvares, seu principal adversário, que estava no PFL – partido que fez nove cadeiras na Ales, sendo uma delas a de Enivaldo.

Os dois tinham visões de mundo, ideologias e formas de fazer política divergentes. Em alguns momentos até se “toleravam”, mas, segundo alguns observadores políticos da época, nunca se bicaram e tampouco se aliaram.

Em 1988, Enivaldo disputou a Prefeitura de Barra de São Francisco e, reza a lenda, que enfrentou além da máquina municipal, a máquina do Estado também. Seu concorrente – Wilson Ferreira – era o nome à sucessão do prefeito da época, Edinho Pereira, fazia parte do grupo político e era amigo de Max Mauro.

A disputa foi acirradíssima e Enivaldo acabou sendo eleito por uma diferença de 400 votos, segundo o jornalista José Caldas da Costa que acompanhou os bastidores dessa eleição e escreveu uma biografia sobre Enivaldo dos Anjos intitulada “Obstinado”. “Max jogou pesado contra Enivaldo nas eleições municipais de 1988. Mas ele ganhou por 400 votos, enfrentando o prefeito da época e o próprio governador”, disse o jornalista.

As desavenças políticas continuaram entre Enivaldo e a família Max Mauro durante toda a  década de 90. No ano de 2000, no governo de Zé Ignácio, quando Enivaldo já de volta à Assembleia vai pleitear a vaga de conselheiro do Tribunal de Contas, Max Filho foi resistência. O filho de Max Mauro, então deputado estadual, teria sido o único a votar contra a indicação de Enivaldo à Corte.

O episódio foi contado à coluna pelo próprio Max Filho, ontem, pouco tempo depois do discurso de Mazinho na Ales. “Eu fui o único deputado estadual que, na época, votou contra a indicação do tio dele para o Tribunal de Contas. Depois, o mesmo se declarou suspeito no julgamento de minhas contas no TCES”, disse Max como quem dá uma justificativa ao ocorrido na sessão da Ales.

Quis o destino que agora, os herdeiros políticos de Max Mauro e Enivaldo dos Anjos se encontrassem na mesma legenda, com projetos eleitorais semelhantes – Max Filho pode ser candidato a prefeito de Vila Velha e Mazinho, de Vitória, no ano que vem – e trouxessem na bagagem a mesma rixa de outrora.

Outro olho no futuro

Na entrevista que deu à coluna, Max não chegou a culpar, com todas as letras, o partido por sua derrota nas urnas e nem disse que estaria de saída por ter perdido as eleições.

Ele citou episódios de turbulência no ninho – como quando sofreu intervenção em Vila Velha por parte do PSDB estadual – e a postura ideológica do atual presidente estadual da legenda, Vandinho Leite, para explicar os motivos de sua provável saída. “O diálogo com Vandinho é bom, mas estão adotando posições meio que ultraconservadoras, o que nos deixa um pouco incomodados”.

Prefeito de Vila Velha, Arnaldinho Borgo

Mas, as eleições do ano que vem e a leitura que tem feito das movimentações políticas também estariam empurrando Max Filho para fora do ninho tucano. O PSDB está no governo e o governo é aliado do prefeito de Vila Velha, Arnaldinho Borgo (Podemos).

É fato que a aliança com o governo agora não impede a federação PSDB/Cidadania ou qualquer outro partido que esteja na base aliada de lançar candidatos próprios nas eleições do ano que vem. Mas o discurso de Mazinho já sinalizou que, dentro do partido, Max não é unanimidade e, talvez, nem prioridade. “Já declaro aqui: lá em Vila Velha, para a eleição do ano que vem, o meu apoio será de Arnaldinho Borgo”.

Quem cala consente?

Vandinho, mais uma vez, mergulhou. Não falou sobre o assunto na sessão e nem ao ser procurado pela coluna. Ficou em silêncio ontem e na segunda-feira.

Questionado se em seu discurso estaria falando em nome do partido ou em nome do presidente da legenda, Mazinho descartou. “Falei por mim”. Mas como não teve nenhuma de suas palavras retiradas ou amenizadas pela direção do PSDB, a leitura que se faz é de que ele tenha servido de porta-voz do ninho para mandar um recado ao ex-prefeito.

Agora, a bola está com Max Filho. Se, até então, ele ainda estava em dúvidas sobre sua permanência ou não na legenda, o discurso de Mazinho estica a corda e o força a tomar uma decisão.

Max pode repensar e recuar? Sim. Mas o mais provável é que use o ataque do correligionário como impulso para levantar voo e ir para bem longe do ninho. Nada garante que, ao fazer isso, encontrará o abrigo necessário para seus projetos políticos. É uma aposta. Agora, uma coisa é certa: ele e Mazinho, intencionalmente ou não, acabam de escrever mais um capítulo da desavença entre duas grandes famílias tradicionais da política capixaba que já dura quase 40 anos.

 

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