Esportes

Quem é a deficiente visual campeã nas ondas e nas pistas de atletismo

Campeã do ArcelorMittal Wahine Bodyboarding Pro tem currículo de sucesso também no atletismo paralímpico e conta como o esporte mudou a sua vida

Flávio Dias

Redação Folha Vitória
Foto: Rodrigo Gavini/ArcelorMittal
Renata Bazone foi campeã da categoria Deficientes Visuais do ArcelorMittal Wahine Bodyboarding Pro

No pódio do primeiro dia de disputas do ArcelorMittal Wahine Bodyboarding Pro,  que vai até sábado na praia do Solemar, em Jacaraípe, em Serra, a campeã da categoria Deficientes Visuais era só emoção. Mas alegria pela conquista do título inédito da etapa brasileira do Circuito Mundial ia além do troféu. O significado de estar ali no pódio era bem maior.

Renata Bazone, 49 anos, é apenas uma estreante no bodyboarding. Entretanto, tem uma carreira de sucesso no atletismo paralímpico. Foi campeã mundial nos 800m na categoria T11 (cegueira total) e bronze nos 1.500 no Mundial de Doha, em 2015, entre outras conquistas.

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"O esporte quer dizer muita coisa pra mim. É o físico e o psicológico. É o meu bem-estar, é estar praticando para eu estar me superando a cada dia, vencendo as minhas dificuldades, as minhas limitações", conta Renata Bazone.

Diagnosticada com retinose pigmentar, Renata parou de enxergar aos poucos, principalmente após os 30 anos de idade. Assim, começou tarde no esporte. E o fez somente após perder a visão.

"Eu sempre gostei de esporte, mas só comecei a praticar mesmo depois que eu comecei a ficar deficiente. O médico disse que seria interessante eu fazer alguma atividade física porque eu poderia entrar em depressão por querer fazer coisas e não conseguir, e que o esporte me ajudaria. O esporte tem disso, de fazer a gente se superar sempre. Foi a primeira dica que eu recebi", lembra.

O conselho médico virou profissão e Renata, carioca que chegou ao Estado ainda na infância, fez carreira nas pistas. Agora, encara o desafio de pegar onda sem enxergar as ondas.

"Quando eu tô descendo a onda, não dá pra explicar a sensação. Você não vê o tamanho da onda, a força da onda, o técnico que vê. Ele fala 'essa é grande, essa tá vindo forte'. A gente confia. Ele fala '1...2...3... e você vai'. É o comando que ele fala pra mim e eu vou. Ele vê, mas a gente só imagina. Depois que você pega a onda, é uma sensação muito boa. Tem que ter um controle, eu sinto como se fosse um motor embaixo da prancha, parece que a onda vai tirar a onda da sua mão. É muito legal, é muito gostosa a sensação. É irado mesmo", conta.
Foto: Daniel Zappe/MPIX/CPB
Renata Bazone com o guia Fernando Martins e a medalha de ouro nos 800m no Mundial Doha/2015

A transição das pistas de atletismo para o mar veio a convite do treinador Hudson Renato de Paula Oliveira, com quem ela já treinava nas pistas. Referência no esporte paralímpico, Renata aceitou o novo desafio. Detalhe: topou pegar onda sem enxergar e sem saber nadar!

"Eu já conheço o professor Hudson há 10 anos e ele comentou que tava pensando em abrir o projeto junto com a Neymara (Carvalho) sobre inclusão do deficiente visual no bodyboarding. Acho que tinha tudo a ver eu estar participando desta competição, que fala da inclusão no bodyboarding. Eu dou palestras de inclusão nas escolas, em vários locais, então, eu aceitei o convite do professor Hudson. Mas eu falei: 'Não sei nadar, não sei bodyboarding, não sei nada! Só vou pra praia pra pegar Sol'. Mas ele topou e me chamou no final do ano passado pra gente começar o treinamento. E deu certo. Espero que a gente continue com o projeto todo redondinho", revela a campeã, que mora na Serra e competiu "em casa" no ArcelorMittal Wahine Bodyboarding Pro.

"ESPORTE NÃO É O INÍCIO, É O MEIO"

Responsável por levar a campeã mundial de paratletismo para dentro do mar, o professor Hudson Renato de Paula Oliveira explica como o esporte ajuda na socialização e no dia a dia dos deficientes visuais.

"Para os deficientes visuais, principalmente, o esporte não é o início, é meio. O início é a retomada das atividades da vida diária. Experimente tomar banho no escuro, por exemplo. Depois de superada essa etapa, vem a atividade física com orientação de um profissional de Educação Física que seja especialista na área. Pois, só então, virá o convite para a prática esportiva", avalia o professor.

Hudson Renato é técnico de natação paralímpica, certificado pelo Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), de paratletismo, paratriatlo e bodyboarding PCD. E destaque que não há limites no esporte, seja ou não paralímpico.

"No caso da Renata, ela seguiu esse trajeto completo, pois só é paratleta aquele atleta que participa de um evento paralímpico. A palavra 'superação' para essas pessoas já não se faz usual, é somente um clichê. Elas simplesmente participam, competem, seja qual for a deficiência. Você e eu, nós somos deficientes? Em que evento de nossa vida? Essa é a questão pra nós. Mas, para o deficiente, a questão é 'quando serei eficiente nesse mundo?'. E o esporte mostra que o céu é o limite".

COMPETIÇÃO RECOMEÇA NESTA QUARTA-FEIRA

A terça-feira (23) foi de folga no ArcelorMittal Wahine Bodyboarding Pro, já que as condições do mar têm previsão de melhorar para os próximos dias. Assim, a competição recomeça nesta quarta-feira (24), a partir das 8 horas, na praia do Solemar, em Jacaraípe.

Na segunda-feira, segundo dia de disputas, aconteceram as baterias da repescagem das categorias profissional e máster, além das primeira baterias da pro júnior.

A primeira colocação na profissional ficou com a japonesa Yuka Nishimura. Em segundo, a portuguesa Luana Dourado e, empatadas em terceiro, as brasileiras Kirtys Montenegro e Maria Rita Braga. Na pro júnior, primeiro lugar para a capixaba Luna Hardman, uma das estrelas da competição. Em segundo, a francesa Emie Padois e, em terceiro, Aarya Tabalno, do Havaí. Na master, vitória da portuguesa Marta Leitão, seguida das brasileiras Karla Costa e Maria Rita Braga.

"Foi difícil. Mudança de mar afeta muito. Todas as meninas super bem. E apesar de ter perdido na profissional, consegui me manter viva no campeonato na master. Cada bateria, um novo desafio. Estou animada para as próximas", destacou a carioca Karla, duas vezes campeã mundial, que mora há mais de 20 anos no Havaí.

ArcelorMittal Wahine Bodyboarding Pro 2024

Programação

Quarta (23) a sexta (26)
8h00 — Competições
Sábado (27)
8h00 — Finais das categorias Profissional, Pro Junior e Master, Praia de Jacaraípe;
14h00 — Premiações
19h00 — Festa de Encerramento no Silva's, em Carapebus, com show das bandas Pele Morena e Jefinho Faraó & Funk Retro (ingressos no site zig.tickets)
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