Saúde

Conselho de Psicologia encontra pacientes amarrados e trancados em hospital de Cariacica

De acordo com o CRP-ES, as práticas realizadas podem se configurar como crime de tortura

Foto: reprodução/CRP

Uma inspeção federal realizado pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP-ES), realizada na última quarta-feira (5), verificou a existência de diversas irregularidades no Hospital Estadual de Atenção Clínica (HEAC) - antigo Adauto Botelho, em Cariacica. Entre as mais graves estão pacientes amarrados e trancados contra a própria vontade.

A ação foi realizada pelo Conselho Regional de Psicologia do Espírito Santo (CRP-ES), junto do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), do Ministério Público Estadual (MPES) e do Conselho Regional de Serviço Social do Espírito Santo (CRESS-17).

A inspeção visitou mais de 40 hospitais psiquiátricos em 17 estados do País. No hospital Adauto Botelho foram encontradas algumas irregularidades como contenções mecânicas irregulares, pacientes amarrados aos leitos e sem prescrição médica.

Inspeção

A ação teve início às 6h30, horário da troca de plantão noturno/diurno. De acordo com o CRP, houve resistência à entrada da equipe de fiscalização na instituição. Na entrada, os membros da inspeção perceberam que um dos seguranças patrimoniais do HEAC, ostentava, em seu colete, projéteis de arma de fogo, o que causou estranheza por se tratar de um estabelecimento de saúde.

Entre as irregularidades encontradas estavam pacientes amarrados aos leitos sem registro em prontuário, o que pode configurar prática do crime de tortura. Além disso, foi verificado a existência de portas, grades, trancas e fechaduras em todos os acessos e para deslocamento interno no hospital. Entretanto, nos sanitários e quartos portas são inexistentes e não há privacidade.

Nos banheiros dos pacientes não havia assentos sanitários nos vasos sanitários. Segundo a denúncia, sinais de mofo são encontrados em diversos setores do hospital, inclusive na dispensa de alimentos da cozinha.

Foto: reprodução/CRP

Internações

Um dos pacientes relatou ter sido transferido da Unidade de Urgência para a de Curta Permanência contra a própria vontade. Ele desejava alta assim que estivesse estabilizado e liberado da urgência.

Segundo a psicóloga Keli Lopes dos Santos, presidente da Comissão de Saúde do CRP-ES, que participou da inspeção, faltam estratégias para se lidar com a crise. “Na ausência de projeto terapêutico da instituição e individual para cada paciente a estratégia que é utilizada é medicar e amarrar. Não existe sequer um profissional de Psicologia na Unidade de Urgência que poderia trabalhar outras estratégias para o manejo da crise”.

Anticoncepcional obrigatório

A inspeção também denúncia a discriminação em relação às mulheres e, ainda, práticas que tendem à eugenia. Mulheres são obrigadas a utilizar anticoncepcionais injetáveis. Além disso, são obrigadas a tomar banho e depiladas por funcionárias. Por outro lado, os homens quando querem se barbear recebem aparelhos e podem resolver a questão sozinhos.

Internados

De acordo com os dados apresentados pela instituição, há 49 pacientes internados na unidade de curta permanência, sendo que desses, sete pacientes tem mais de 100 dias de internação e 13 pacientes mais de 45 dias. Isso significa que mais de 40% dos pacientes internados excedem o tempo previsto para internação na curta permanência (45 dias).

Foto: reprodução/CRP

Vigilância Sanitária

Foi constatada, ainda, a necessidade de uma fiscalização da Vigilância Sanitária. Destaca-se que o hospital continua registrado no Ministério da Saúde como Hospital Adauto Botelho, sendo reconhecido por HEAC apenas no Estado do Espírito Santo. Diante do encontrado, a equipe concluiu que, apesar da mudança do nome da Unidade, o seu setor psiquiátrico ainda funciona com uma lógica manicomial e asilar. Apenas na ala de atenção clínica observou-se práticas de atenção à saúde condizentes com as diretrizes do SUS.

Outro Lado

A Secretaria de Estado de Saúde (Sesa) foi procurada pela reportagem é respondeu que a direção do Hospital Estadual de Atenção Clínica recebeu a visita da equipe e, até o momento, não recebeu notificação formal com irregularidades encontradas na unidade. 

Além disso, a direção do HEAC disponibilizou todos os documentos requisitados pela inspeção. Quanto às internações do tipo involuntárias elas estão previstas na Lei 10.216/2001 e são aquelas que são realizadas, por exemplo, pelo SAMU 192. O Hospital, em consonância com a Lei 10.216/2001, faz a comunicação dessas internações e suas respectivas altas ao Ministério Público Estadual.

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