JULGAMENTO DO CASO MILENA GOTTARDI

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Caso Milena: Defesa de Hilário vai usar cartas de amor de médica para ex-policial

Advogado de defesa de Hilário - denunciado por ser mandante do assassinato - , diz que material vai servir para que júri conclua que imagem do réu foi "distorcida", pois Hilário e Milena formavam um casal igual a qualquer outro

Marcelo Pereira

Redação Folha Vitória
Foto: Reprodução

A defesa do ex-policial civil Hilário Frasson, acusado pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPE-ES) de ser o mandante do assassinato da médica Milena Gottardi, irá utilizar, em sua estratégia, cartas e cartões de datas celebrativas escritos pela vítima nos anos de 1997, 1999 e 2001. 

O objetivo da defesa é demonstrar a existência também de laços afetivos entre o casal. Além disso, um e-mail enviado por Milena para Hilário em 2017 também será usado pela defesa. 

O julgamento começa na próxima segunda-feira (23), às 9h, no Fórum Criminal de Vitória.

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As cartas e cartões endereçados a Frasson, segundo o advogado responsável pela defesa de Hilário, Leonardo Gagno, servirão para que o júri possa concluir que a imagem do réu foi "distorcida pela acusação, que expõe somente informações sobre as brigas dos dois".

"Tivemos acesso a várias provas que comprovam que Milena e Hilário formavam um casal como qualquer outro. Como em qualquer outra relação, havia divergências de opiniões e discussões. No entanto, como podemos verificar, também havia amor e companheirismo entre os dois", explica.

O advogado conclui, reforçando que a morte de Milena foi uma grande tragédia e que vai esclarecer todos os fatos. "Destacamos que respeitamos muito a dor da família da Milena", acrescentou.

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Material era da época em que Hilário e Milena eram namorados

O material foi escrito por Milena anos antes do casamento, formalizado em 2004, quando ainda namoravam. São cartões e mensagens enviado por ela a Frasson em datas especiais para o casal nos anos de 1997, 1999 e 2001. 

Em um deles, enviado no Dia dos Namorados, para comemorar os quatro anos de relacionamento, ela escreveu sobre a importância dele na vida dela. 

“.... não apenas pelo amor que você me dá, mas também pelo companheirismo e paciência que faz você uma pessoa verdadeiramente especial.” 

Ela também agradece o apoio do então namorado. “Obrigada por caminhar junto comigo.”

Em um outro cartão, a médica destaca a gentileza, compreensão e amabilidade de Hilário. “Esse cartão seria muito pequeno para resumir todas as suas qualidades”, registra. 

E-mail de médica se dizendo arrependida de processar o marido também será utilizado

As cartas e cartões se juntam a um e-mail, encaminhado de Milena para Hilário em 6 de abril de 2017, que a defesa também irá utilizar onde a médica diz que se mostra arrependida de ter ingressado com uma medida judicial, na qual ela conseguiu o direito de sair de casa com as filhas — na época, o casal estava em processo de separação. Esse e-mail foi encaminhado pela vítima ao réu cerca de cinco meses antes do crime.

A ata notarial registrada em cartório há dois anos, que comprova que o e-mail foi encaminhado de Milena para Hilário, foi anexada ao processo na última segunda-feira (16), uma semana antes do início do julgamento dos seis réus acusados de envolvimento no assassinato da médica.

A prova foi obtida por meio do computador do ex-policial civil. "Ele me forneceu a senha e me autorizou a entrar em sua nuvem, onde está o e-mail", explicou o advogado Gagno, responsável pela defesa de Hilário Frasson.

DEFESA DA FAMÍLIA E PROMOTORES DO MPES

O assistente de acusação e o advogado representante da família de Milena Gottardi, Renan Sales, foi procurado para falar sobre o material apresentado pela defesa. Por meio de sua assessoria, disse que não vai se pronunciar sobre essas questões e que vai aguardar o julgamento.

Já o promotor Rodrigo Monteiro da Silva, que compõe o grupo de promotores do Ministério Público do Espírito Santo, disse que os cartões e cartas de amor não alteram em nada a estratégia da acusação. 

"Basta fazer uma análise objetiva para ver o contexto em que essas cartas foram escritas. Não muda em nada o que se afirma sobre o réu", declarou.

Milena registrou carta em que relatava ameaças do marido

O material usado pela defesa de Hilário vai de encontro a uma carta registrada pela médica Milena Gottardi em que ela relatava sofrer ameaças do marido. 

O documento foi encontrado pela família da médica, logo após ter sido assassinada, em meio a seus pertences. A carta estava registrada em cartório. 

Milena descreve suas angústias, sua preocupação com as filhas, as dificuldades no processo de separação. Ela também surpreende ao escrever que tinha muito medo de ser morta. 

Ela fez ainda um pedido: se algo acontecesse com ela, que a guarda das filhas fosse entregue a seu irmão, Douglas Gottardi. 

A carta foi entregue à polícia. Em outubro de 2017, foi confirmado por laudo grafotécnico que realmente o documento havia sido escrita e assinada por Milena. A carta foi escrita cinco meses e nove dias antes do crime. O assassinato aconteceu em 14 de setembro daquele ano.

Na carta, Milena fala que o casamento de 13 anos não ia bem. Ela diz que Hilário aparentava ter transtorno obsessivo compulsivo. "Orientei por diversas vezes a procurar tratamento psiquiátrico, mas ele nunca levou a sério. Ia ao psiquiatra, mas não seguia ao tratamento proposto", registrou.

Ela conta que a relação dos dois era de posse. "Ele sempre demonstrou muita obsessão a minha pessoa, mesmo antes do namoro", destacou.

Ela prossegue dizendo que a situação estava insustentável. E, por isso, decidiu que sairia de casa com as crianças. "Diante de todos esses fatos, hoje sairei de casa com minhas filhas por determinação policial, uma vez que estou desde o dia 05/03/17 tentando convencê-lo a sair de casa e/ou aceitar pacificamente a separação. No entanto não obtive êxito nas inúmeras tentativas". 

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Milena diz que Hilário não permitiria que ela saísse de casa. "Me sinto uma refém dentro da minha própria casa. Está insuportável! Não quero brigar com ele, mas também não consigo ter uma conversa, um diálogo. Ele não permite isso", relata.

A médica termina se dirigindo às filhas: "Tenham certeza que vocês são o bem maior que tenho. O meu amor por vocês é infinito. Um dia vocês saberão que a mamãe tentou de todas as formas manter o casamento, mas não deu. E a separação foi a forma que eu encontrei de buscar a nossa paz e a nossa felicidade. Eu sempre estarei com vocês para protegê-las e amá-las", conclui.

Leia a carta de Milena na íntegra:

"Vitória, 05 de abril de 2017

Meu nome é Milena Gottardi Tonini Frasson, sou mãe de (....), 9 anos, e (....) 1 ano e 10 meses. Sou casada com Hilário Antônio Fiorot Frasson, mas estamos em processo de separação.

Temos um relacionamento de 20 anos (7 anos de namoro e 13 de casamento).

Por várias vezes ele demonstrou um temperamento difícil com mudanças de humor frequentes durante o dia. Reage com agressividade em algumas situações, porém sem agressão física. A agressividade é feita através de palavras. Tem manias como de limpeza excessiva que ao meu ver é muito sugestivo de transtorno obsessivo compulsivo (...) e na personalidade sempre me preocupou (...) me oprimiu porque nunca sabia como ele reagiria a situações do cotidiano. Orientei por diversas vezes a procurar tratamento psiquiátrico, mas ele nunca levou a sério. Ia ao psiquiatra, mas não seguia ao tratamento proposto.

A situação ficou muito mais grave a partir do momento em que o alcoolismo começou a se tornar algo real nas nossas vidas. Ele era um etilista social (embora mesmo nos finais de semana sempre abusava da quantidade de álcool). O hábito se tornou diário.

Em relação às meninas, sempre foi um bom cuidador, porém, principalmente com (...) *nome de uma das filhas, usava (...) palavras opressivas e de castigos físicos (...).

A nossa relação sempre foi de posse. Ele sempre demonstrou muita obsessão a minha pessoa, mesmo antes do namoro.

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Diante de todos esses fatos, hoje sairei de casa com minhas filhas por determinação policial, uma vez que estou desde o dia 05/03/17 tentando convencê-lo a sair de casa e/ou aceitar pacificamente a separação. No entanto não obtive êxito nas inúmeras tentativas.

As conversas ele sempre partia para o lado das ameaças. Falava que não sairia de casa, nem deixaria as meninas, que se eu me separasse ele declararia guerra que se mataria (falou na pessoa de (....) *nome de uma das filhas, dentre outras falas.

Me sinto uma refém dentro da minha própria casa. Está insuportável! Não quero brigar com ele, mas também não consigo ter uma conversa, um diálogo. Ele não permite isso.

Temo pelas crianças. A (....) *nome de uma das filhas está em acompanhamento com a psicóloga (...NOME). A qual orientou que as poupemos de qualquer divergência entre casal, mas ele grita e fala coisas terríveis perto dela. Não aguento essa situação, por isso pedi ao juiz a liberação para sair de casa com as meninas para me poupar e, principalmente, (...) de um ambiente hostil.

No entanto, não sei qual será a reação dele. Tenho medo que essa agressividade verbal se concretize em atitudes. Temo em ele tirar sua própria vida e como vemos em muitos casos tirar a minha vida também. Poderia ir na delegacia e relatar meus temores, mas não quero prejudicá-lo. Desejo muito que a situação seja resolvida pacificamente.

Embora, desejo e rezo pela paz eu tenho duas crianças que dependem de mim que são (...) *nome das duas filhas, dependem do meu amor, do meu carinho, dos meus ensinamentos e financeiramente.

Por isso, venho através desta carta expor a minha vontade que se acontecer algo de ruim comigo, por exemplo, se Hilário Antônio Fiorot Frasson me matar e pode ser que tente se matar também, eu desejo que as minhas filhas (...) *nome das duas filhas fiquem sob guarda do meu irmão Douglas Gottardi Tonini com a supervisão da minha mãe Zilca Maria Gottardi Tonini porque assim ficarei em paz. Sei que eles tem plena condições de seguir com os ensinamentos e afeto para com as minhas filhas da forma que eu mesma faria. Bem como de utilizar todos os benefícios financeiros a favor da educação das minhas filhas.

Expresso essa vontade em vida e na forma dessa carta para que se acontecer algo comigo, que as autoridades responsáveis possam se sensibilizar com o desejo de uma mãe que estava em busca somente de paz.

A separação será para mim a busca de paz e com isso uma casa harmoniosa para criar minhas filhas.

(...) *nome das duas filhas tenham certeza que vocês são o bem maior que tenho. O meu amor por vocês é infinito. Um dia vocês saberão que a mamãe tentou de todas as formas manter o casamento, mas não deu.

E a separação foi a forma que eu encontrei de buscar a nossa paz e a nossa felicidade. Eu sempre estarei com vocês para protegê-las e amá-las.

Milena Gottardi Tonini Frasson".






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